Na natureza, os pulgões representam um dos exemplos mais ilustrativos do que acontece quando um organismo decide se repetir sem introduzir qualquer variação.
Esses insetos se reproduzem principalmente de forma assexual, por meio de um mecanismo conhecido como partenogênese, no qual uma fêmea gera descendentes geneticamente idênticos a ela. É um processo rápido, eficiente e aparentemente vantajoso: em poucos dias, uma planta pode ficar coberta por gerações inteiras de clones perfeitos.
No entanto, essa eficiência também é a sua condenação. Como explica o biólogo evolutivo Graham Bell, “os organismos que abrem mão da recombinação genética ganham velocidade, mas perdem futuro”. Ao se clonarem repetidamente, os pulgões desfrutam de um crescimento explosivo quando as condições são favoráveis, mas carecem da diversidade genética necessária para se adaptar quando o ambiente muda. E o ambiente, inevitavelmente, muda. No fim do verão, com as variações de temperatura, umidade e as defesas naturais das plantas, muitas populações de pulgões entram em colapso. Não porque não trabalhem duro — afinal, se reproduzem de forma frenética —, mas porque são todos iguais. São extremamente eficientes, porém profundamente vulneráveis.
“Empresas homogêneas prosperam em períodos de estabilidade, mas fracassam quando o ambiente se torna incerto.”
Esse padrão biológico funciona como uma metáfora precisa do que acontece no mundo corporativo quando uma organização passa a se clonar: quando contrata perfis idênticos, reproduz estruturas rígidas, promove líderes com a mesma personalidade e constrói equipes que compartilham a mesma formação, as mesmas referências e, em última instância, os mesmos pontos cegos. Assim como os pulgões, empresas homogêneas prosperam em épocas de estabilidade, mas fracassam quando o ambiente se torna incerto, acelerado ou exige novas respostas.
Muitas empresas, sem perceber, caem na tentação dessa reprodução assexual organizacional porque, por um tempo, ela costuma funcionar muito bem. Buscam “mais do mesmo”: mais pessoas que se encaixem, que não ultrapassem os limites estabelecidos, que não gerem conflito, mais gente que pense como o líder. Essa aparente harmonia reduz atritos, agiliza reuniões e acelera decisões. Mas essa velocidade é enganosa. Trata-se de uma eficiência semelhante à dos pulgões: funciona enquanto o ecossistema não muda. Quando o mercado, a tecnologia ou os clientes exigem uma resposta diferente, a organização homogênea não sabe reagir. Não tem variação. Não tem alternativas. E assim perde uma das capacidades mais determinantes da competitividade: a adaptabilidade. Ou seja, a capacidade de reagir, antecipar, interpretar sinais, questionar padrões, gerar opções, explorar e mudar. Porque isso só acontece quando há diversidade suficiente para que o sistema não se torne um eco de si mesmo.
A autoclonagem organizacional, além disso, tem um efeito estrutural: gera pontos cegos sistêmicos. Assim como os pulgões não percebem a tempo a mudança das estações, empresas homogêneas não detectam ameaças externas, rupturas tecnológicas, mudanças de contexto ou variações no comportamento dos consumidores. Operam a partir de um olhar repetido e limitado. O sistema se defende de tudo o que não se encaixa, assim como uma colônia de clones rejeita qualquer mutação. E, desse modo, a empresa se fecha em si mesma.
“Devemos valorizar tanto quem questiona o status quo quanto quem questiona a mudança.”
Mas, assim como na natureza, é preciso pensar em equilíbrio. Se enriquecermos a empresa apenas com perfis disruptivos, inovadores, resilientes e adaptativos, o caos pode se instalar. Todas as organizações precisam de perfis analíticos, estruturados e conservadores. Devemos valorizar tanto quem questiona o status quo quanto quem questiona a mudança, pois estes últimos criam as primeiras barreiras que permitem consolidar qualquer iniciativa antes que ela precise enfrentar a sociedade, o consumidor ou o cliente. Como bem diz Barry Johnson, são polaridades que precisam coexistir e encontrar o equilíbrio adequado. Nem um extremo, nem o outro.
Diante disso, organizações competitivas, inovadoras e resilientes operam segundo um princípio oposto ao dos pulgões: não buscam clones, mas um amplo espectro de variações dentro dos limites culturais estabelecidos. Entendem que sua força não está na uniformidade, mas na heterogeneidade compatível. Promovem equipes nas quais convivem diferentes abordagens, experiências, sensibilidades e formas de interpretar a realidade. Fomentam ambientes onde não se valoriza a uniformidade, mas o contraste. Compreenderam que a diversidade não é um gesto reputacional, mas uma infraestrutura estratégica.
O desafio mais exigente recai sobre os líderes, que precisam de coragem para estar dispostos a ouvir o que não querem ouvir, integrar aquilo que desafia seus modelos mentais e aceitar que a inteligência coletiva se constrói a partir da diferença, e não da repetição. Afinal, quando duas pessoas pensam exatamente igual em tudo, uma delas é dispensável.
As organizações que entendem isso não eliminam o atrito; ao contrário, transformam-no em motor criativo. Não temem as diferenças, mas as utilizam como vantagem. Não se entrincheiram no que já sabem: ampliam seu repertório de conhecimento.
Como escreveu o neurobiólogo Gerald Edelman: “A diversidade não é um luxo; é o método que a vida usa para garantir a sobrevivência”. As empresas não são organismos biológicos, mas enfrentam desafios semelhantes: incerteza, competição, ciclos em constante mudança, pressão ambiental, a necessidade de mutar para não desaparecer. Caso contrário, empresas que se clonam, assim como os pulgões no fim do verão, acabam enfrentando uma extinção silenciosa.
Por Gabriel Weinstein, managing partner na Europa.