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Em plena pandemia, não foram poucos os que imaginaram o fim da globalização.
No entanto, a medida que o mundo volta às suas atividades, vemos que a globalização não terminou; redefiniu-se. Proponho-lhes analisar juntos os valores que irão marcá-la a futuro.O mundo começa a deixar para trás o pior da pandemia, segundo os da
dos que chegam dos mais diferentes mercados. EUA cresce (6,5% no segundo trimestre em comparação ao mesmo período de 2020), a UE (2%). Inclusive uma economia como a da América Latina pode esperançar-se: segundo projeções da CEPAL (Comissão Econômica para América e o Caribe) a região crescerá 5,9% este ano.

Embora estes dados não refletem mais que uma recuperação parcial do perdido, mostram uma direção que já iniciando o quarto trimestre do ano confirmam uma tendência em crescimento. Em uma de minhas últimas notas, falamos da mentalidade da abundância, que nos permite que voltemos a nos posicionar como organizações em matéria de recursos. Hoje, quero convidá-los a repensar a situação na qual deveremos saber organizar nossa cadeia de valor a futuro.

 

Não é o fim, é um reordenamento

Em plena pandemia, não foram poucos os que esperaram o fim da globalização. Hoje vemos que a globalização não terminou, continuamos consumindo telefones celulares em Taiwan; carros produzidos em Xinjiang (China); vinho coletado em Stellenbosch (África do Sul); carne embalada em La Pampa (Argentina); como também camisas produzidas em Izmir (Turquia) ou sapatos desenhados em Romana (Itália). Em novembro de 2020, a troca de bens a nível global havia recuperado seu volume a níveis pré pandemia, segundo dados do CPB World Trade Monitor. No final deste ano, a Organização Internacional de Comércio (WTO, suas siglas em inglês), adverte que haverá crescido 6,6% mais.

No entanto, a dinâmica para abastecer este mercado global sim, está mudando, conforme foi previsto por Steven Altman y Phillip Bastian na Harvard Business Review há uns meses: “O negócio global não desaparece, mas sim muda sua paisagem. E isso tem implicações que deveremos ter em conta do lado da estratégia e a gestão”.

   

Nem tudo é dinheiro

O modelo de globalização pré pandemia guiava-se por uma simples regra: buscar o menor custo possível de produção e a maior rentabilidade potencial. Ou seja, produzo onde é barato e o levo para onde o consumidor paga mais.

A batalha contra COVID19 interrompeu essa cadeia de valor por vários meses em todo o mundo. A atividade comercial a nível global caiu mais de 10%, segundo dados do Fundo Monetário Internacional (FMI). E embora esta perda não é muito diferente ao sucedido em 2009, quando o mundo sofria o pior impacto da crise financeira originada pelos subprime, o presente nos antecipa que a globalização que chega é muito diferente.

Em uma primeira reação à paralização global, especulava-se com que o conceito do “off shore” seria substituído pelo “near shore” para garantir assim nossa subsistência. A meta: buscar proximidade, menos exposição e dependência de terceiros. No entanto, depois da experiência da primeira reação, cada vez mais companhias deixam para trás os planos para aproximar fisicamente suas fábricas de produção de seus mercados. A razão: o aumento de custo que significava, não garantia paralelamente um aumento da resiliência da cadeia de valor. O que está provando ser mais eficiente nesse sentido é diversificar a cadeia de valor de forma eficiente entre centros de produção locais e estrangeiros. Para fazê-lo, focalizam-se as inversões em ampliar e reorganizar a base tecnológica e de inventário. No entanto, além dos aspectos técnicos, o novo projeto que estamos vendo, responde também a um novo conjunto de valores para definir a relocação dos pontos neurálgicos da cadeia.

 

Um novo conjunto de valores

Então, se antes da pandemia o que definia a configuração e a extensão da cadeia de valor era o custo, a batalha contra o COVID nos obrigou a reconsiderar justamente essa valorização. A experiência dos últimos dois anos nos ensinou a valorizar inclusive o importante que é poder produzir em um destino que garanta a liberdade e as regras de jogo transparentes (democracias preferíveis do que ditaduras); que não somente declare e sim que exerça o respeito pelo entorno (sustentabilidade); e que seja o suficientemente atraente para seduzir ao talento que hoje é global. A sustentabilidade, a acessibilidade e o nível de talento se transformaram assim nos fatores tão ou mais importantes que o custo na hora de projetar nossa nova cadeia de valor global. Um bom exemplo disto é o que se vê atualmente na China motivado pela guerra comercial e competência iniciada há vários anos pelos EUA.. e que hoje desafia também cada vez mais os blocos menores , como a UE ou o Commonwealth, ao tomar partido.

Evidentemente, o grande mercado que continua sendo o gigante asiático não deixará de existir, nem de seduzir. No entanto, desde o ano passado cresce a quantidade de companhias que reduzem sua produção na China. Entre as mais recentes estão Microsoft, Adidas, a fabricante de câmaras GoPro como também a automotora Hyundai Motors ou a electrónica Samsung. Uma pesquisa entre 260 empresas globais realizada por Gartner no ano passado revelou que 33% dos consultados já haviam iniciado o processo de redução. “Todos estão adaptando-se à relação entre eficiência e resiliência”, comenta o relatório.

Como o ilustra bem uma das últimas capas de The Economist, China hoje, apesar de seu poder econômico, está sofrendo porque atenta contra duas das principais variáveis que seduzem um sócio comercial do amanhã: a credibilidade nas regras e na liberdade. Os que duvidam, convido a recordar quando foi a última vez que se viu Jack Ma (fundador de Alibaba) ou Cheng Wei (fundador da empresa de transporte urbano Didi, que mais de 67 milhões de pessoas utilizam por mês) em público. O New York Times resumiu de forma clara há uma semana: “What China expects from Businesses: Total Surrender”. No entanto, o homem maximiza seu potencial em um ambiente de liberdade, como já dizia o próprio Karl Marx. A cidade-estado que foi Florência, demonstrou alguns anos antes: graças à abertura, liberdade e o incentivo do conhecimento, converteu-se no berço do Renascimento. O ecossistema que gerou a cidade de São Francisco é um dos melhores exemplos de nossos tempos: com sua mistura de nova cultura e capital serviu de base para esse centro de inovação global chamado Silicon Valley.

 

O mundo que está por vir

Tanto como organizações ou como consumidores, a pandemia nos levou a questionarmos a sustentabilidade de nosso modelo de vida. Impulsionados por um mundo muito mais interconectado tecnologicamente, nos questionamos hoje desde quando se produzem os produtos que consumimos até como nós mesmos os processamos. Como força de trabalho que somos, reconsideramos nossa própria equação de valor. Já não estamos dispostos a sacrificar nossa existência por fatores que não respondam a nosso próprio conjunto de valores como é demonstrado nesses dias pelo fenômeno: a onda de pedidos de demissão que atravessa e preocupa as organizações e várias das principais economias do mundo, que saem em busca de uma vida diferente.

Finalmente, o capital, que desde o início, valoriza a rentabilidade que gera uma força laboral inovadora começa a afastar-se da promessa de baixo custo. Começa a priorizar que por meio da tecnologia tem hoje a liberdade de redesenhar e adaptar cadeias produtivas ao redor do mundo. A pandemia derrubou os últimos preconceitos sobre o compromisso e a produtividade que existiam a respeito. Do contrário, que perguntem também a Grã-Bretanha, que atualmente está vivendo seu próprio processo de “decoupling” da cadeia de valor. Pelo Brexit, ofícios tão essenciais como condutores ou abastecedores não conseguem abastecer-se de suficiente talento. O resultado: o Governo teve que destacar o Exército para garantir o abastecimento com produtos tão essenciais como a gasolina ou alimentos.

A globalização pós Covid nos desafia a reordenar o conjunto de valores que podem transformar nossas organizações em uma parte valiosa da nova cadeia de valor global. E, nesse sentido, a proximidade ao conhecimento, a liberdade e as garantias das regras de jogo e da sustentabilidade são os segredos a seguir. Esta mentalidade também é a que deverá guiar-nos como líderes no momento de projetar os modelos que devem seguir nossas organizações em um futuro que já é nosso presente.



Por Alberto Bethke, sócio fundador da OLIVIA.

 


Para ler a nota na Forbes entre aquí 

 

 

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