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Desde o final da Idade Moderna, os avanços tecnológicos da Revolução Industrial na Europa legaram ao mundo a exploração dos recursos naturais em escalas nunca antes vistas, o que resultou no acúmulo de danos ao meio ambiente por dois séculos e meio. Embora os progressos técnicos da revolução tenham nos deixado muitos avanços e desenvolvimento econômico e social, eles também originaram grandes problemas que não foram resolvidos até hoje, como comprovam as discussões atuais da COP-26 Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima de 2021, realizada entre 1 a 12 de novembro em Glasgow, na Escócia.

A ideia que temos agora sobre sustentabilidade e responsabilidade social ganhou corpo a partir dos anos 90, a década das grandes conferências sobre o meio ambiente. A Rio 92 inaugurou as conferências internacionais sobre o meio ambiente da nossa era, com resultados efetivos na legislação dos países e tratados internacionais para a diminuição da emissão de substâncias poluentes. Mas muito mais que isso, a Rio 92 iniciou o debate público sobre as consequências econômicas e sociais da atividade industrial e a futura sobrevivência do planeta. De lá para cá, a consciência de que estamos, lentamente, acabando com a Terra se tornou realidade, e hoje já estamos pensando mais em soluções que nos salvarão do futuro sombrio profetizado concretamente pelos cientistas.

Além dos governos, o grande vetor para impulsionar as mudanças em direção ao desenvolvimento sustentável são as grandes corporações e o setor empresarial, que são responsáveis por praticamente tudo que é produzido e consumido por nós, além de ocuparem a maior parte da força de trabalho. A consciência sobre essa responsabilidade nunca foi mais clara: quem, além dos governos, pode efetivamente fazer alguma coisa para reverter a situação? As organizações.

O termo ESG – do inglês “Environmental, Social and Governance” (Ambiental, Social e Governança) – tem ganhado cada vez mais visibilidade, graças a uma maior preocupação do mercado financeiro com a sustentabilidade. A origem do conceito surgiu em 2014, no documento “Who Cares Wins”, criado pelo Pacto Global das Nações Unidas, em parceria com o Banco Mundial. No texto, o então secretário-geral da ONU, Kofi Annan, fazia uma provocação às 50 principais instituições financeiras mundiais para que elas refletissem sobre como integrar fatores ambientais, sociais e de responsabilidade no mercado financeiro. Por isso, a sigla ESG passou a ser usada como estímulo para que as empresas adotem medidas práticas para mitigar efeitos negativos de questões relacionadas a meio ambiente, sociedade e governança corporativa.

 

ESG no Brasil

Por aqui, o entendimento e a incorporação de critérios de ESG pelas empresas é um processo que só cresce. As companhias que já praticam essas ações conseguem aumentar a sua competitividade, tanto no mercado interno quanto externo. Em alguns países, as ESGs já são consideradas como indicativo de solidez, custos mais baixos, melhor reputação e maior resiliência frente às incertezas e crises. No mercado financeiro, inclusive, há a tendência – cada vez mais dominante – dos investidores que só apostam em empresas que cumprem os critérios de ESG como requisito mínimo. De acordo com estudo feito pela Morningstar, a pedido da Capital Reset, no Brasil, fundos ESG captaram R$ 2,5 bilhões em 2020.

 

Pesquisa Rede Brasil Pacto Global

 Uma recente pesquisa da Rede Brasil do Pacto Global da ONU constatou que, no último ano, as discussões sobre ESG cresceram mais de 7 vezes na internet, motivadas, principalmente, pelos efeitos da pandemia da Covid-19. Embora o assunto tenha aparecido mais em veículos da imprensa tradicional, cerca de 84% dos representantes do setor empresarial que participaram da amostragem afirmaram que o interesse por entender mais sobre a agenda e os critérios de ESG aumentou no último ano.

Na pesquisa, as 5 principais iniciativas identificadas nas empresas em direção às ESGs foram:

  1. -Criação de mecanismos internos de compliance e governança que inibam práticas desleais dentro das empresas (79%)
  2. -Gestão de resíduos, reciclagem e reaproveitamento de insumos (76%)
  3. -Criação de comitês e instâncias de governança que contribuam para a integridade da organização (68%)
  4. -Apoio emergencial à Covid-19 (61%)
  5. -Apoio às comunidades do entorno (60%)

Os resultados também apontam para uma diferença significativa entre a percepção do público online em relação às ações de ESG das empresas. As práticas em prol da preservação do meio ambiente e da redução dos impactos estão entre as mais repercutidas nas redes sociais, enquanto as iniciativas de cunho social – apesar de reconhecidas e aplaudidas no meio empresarial – possuem menos apelo popular. É possível que essa visão ainda se altere em razão das questões sociais agravadas pela pandemia, que exigem respostas sociais tanto em âmbito público, quanto privado.

 

Felicidade Corporativa

Com os fatores sociais de ESG como ponto de partida, gostaria de falar sobre o tema da felicidade corporativa nas relações de trabalho. Em meio à recente crise, que abalou inúmeras organizações em escala global, surge novamente a questão do bem-estar.

Como vimos na pesquisa citada acima, a maioria das ações de ESG ainda são pensadas “de dentro para fora” das empresas. Ou seja, são criadas para minimizar os efeitos socioambientais externos, ou então melhorar a administração interna com medidas de responsabilidade e compliance. Ainda não é tão mainstream a ideia de ações de ESG voltadas para a saúde e bem-estar das pessoas que fazem parte da própria organização.

 

O conceito de felicidade corporativa surge a partir da noção de que um ambiente de trabalho mais “feliz” – onde os profissionais se sentem confortáveis e partilham os mesmos valores e propósitos da organização – faz com que as pessoas sejam mais produtivas e menos propensas a doenças relacionadas à saúde mental.

 

O Jeito Harvard de ser Feliz, por Shawn Achor

O tema da felicidade corporativa ganhou muito destaque com o trabalho do pesquisador e palestrante Shawn Achor, autor do livro “O Jeito Harvard de Ser Feliz”, e defensor da psicologia positiva. Com base em pesquisas científicas, ele identifica questões sobre o nosso comportamento, que pode ser moldado para uma atitude mais positiva frente aos desafios da vida.

 

Segundo ele, esperar a felicidade restringe o potencial do cérebro para o sucesso, ao mesmo tempo em que cultivar a positividade estimula a nossa motivação, eficiência, resiliência, criatividade e produtividade, melhorando o desempenho no trabalho e em outras áreas da vida.

 

Mas como isso é possível? Achor defende sua hipótese que, por gerações, fomos ensinados que a felicidade gira em torno do sucesso. Se nos empenharmos o suficiente, teremos sucesso um dia, e só então poderemos ter felicidade. Mas essa concepção estaria errada. Na verdade, quando estamos felizes, e a nossa atitude e espírito são positivos, somos mais inteligentes, mais motivados e, como consequência, temos mais sucesso. A felicidade seria então a responsável por nos levar ao sucesso em praticamente todos os âmbitos da vida: trabalho, saúde, amizade, sociabilidade, criatividade e energia.

 

Ele também diz que ser feliz não é simplesmente acreditar que não precisamos mudar, mas sim perceber que podemos mudar para melhor. Isso porque, com certa frequência, a mera posse do conhecimento sobre o que fazer para ser mais feliz não é o suficiente. É necessário mudar nosso comportamento e criar uma mudança verdadeira e duradoura.

 

O que é felicidade? E felicidade nas empresas?

A definição de felicidade, por si só, é algo pessoal e subjetivo. A felicidade depende da pessoa que a vivencia, por isso não é possível medir até que ponto alguém é feliz. Os cientistas definem a felicidade como a experiência de emoções positivas: o prazer combinado com um senso mais profundo de sentido e propósito.

Para as empresas, a felicidade pode ter um valor difícil de ser mensurado, porém muito importante. Quando uma pessoa tem uma atitude positiva, ela fica mais aberta às possibilidades diante de situações difíceis, se tornando mais ponderada, criativa e receptiva a novas ideias.

 

Esse tipo de atitude pode trazer muitos benefícios para o ambiente de trabalho. Na atual economia do conhecimento, impulsionado pela inovação, o sucesso profissional depende da capacidade das pessoas de encontrarem soluções criativas para os problemas. Não é à toa que as empresas mais vanguardistas, como as de tecnologia e softwares, disponibilizam a seus funcionários espaços de descanso e lazer dentro da empresa. A lógica por trás disso é que cada vez que os funcionários experimentam uma pequena descarga de felicidade, eles se predispõem a enxergar soluções que antes poderiam passar despercebidas.

  

Fazendo da felicidade uma prioridade no trabalho

Ao mesmo tempo em que a tecnologia trabalha para conectar e aproximar pessoas, nem sempre esse é o efeito observado na realidade das empresas, devido a questões de cultura organizacional. No artigo “Making Joy a Priority at Work” – Fazendo da Felicidade Uma Prioridade no Trabalho –, Alex Liu discorre sobre a força que a felicidade tem para conectar as pessoas.


Usando o exemplo dos esportes, onde os times adquirem uma forte conexão entre si e um sentimento de pertencimento e exaltação com as conquistas, o autor questiona se essa mesma felicidade dos esportes poderia ser aplicada nos negócios. A resposta é sim, depende da postura dos líderes.

De acordo com o autor, em todo time, a felicidade surge da combinação entre harmonia, impacto e reconhecimento, algo que os líderes podem incorporar em suas organizações. Ao fornecer às pessoas mais experiências que geram alegria em qualquer ambiente de equipe, os líderes com certeza conseguem colaboradores mais motivados e produtivos.

Contudo, o mesmo artigo também aponta uma outra pesquisa conduzida em 2018 pela A.T. Kearney – uma firma de consultoria norte-americana – que identificou um grande “gap” da felicidade no trabalho. Quase 90% dos entrevistados disseram que esperam sentir um grau substancial de felicidade no trabalho, mas apenas 37% relataram que essa experiência é a realidade. Essa lacuna da felicidade não está restrita a uma faixa etária específica, porém, a maior parte dos entrevistados pertence à geração dos Millenials e da Geração X.

A grande lição disso é que há a necessidade de criação de culturas organizacionais que se preocupem com a felicidade no ambiente de trabalho, como forma de proporcionar experiências que criem nas pessoas um senso maior de interconexão pessoal, propósito compartilhado e orgulho sincero em toda a organização.

 

Depressão e Síndrome de Burnout: os legados da pandemia

Um dos efeitos mais notáveis da pandemia no bem-estar das pessoas foram os relatos de sintomas de depressão e Síndrome de Burnout relacionados à sobrecarga de trabalho. Como reação ao distanciamento social e às novas configurações do trabalho remoto, todos estamos mais tensos e cansados do que o normal, o que pode se tornar um gatilho para quadros mais sérios de crise.

O Burnout é um transtorno psíquico com sintomas parecidos com o estresse, ansiedade e síndrome do pânico, cujas causas estão relacionadas à vida profissional do indivíduo. Se não tratada, pode evoluir para comorbidades físicas, como doença coronariana, hipertensão, problemas gastrointestinais, depressão profunda, alcoolismo, entre outros.

Uma pesquisa da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), que analisou o impacto da pandemia e do isolamento social na saúde mental de trabalhadores essenciais, mostrou que sintomas de ansiedade e depressão afetaram 47% dos entrevistados desde o início da pandemia. Mais da metade destes (27%) sofre de ansiedade e depressão ao mesmo tempo. Segundo a OMS, no Brasil, mais de 11,5 milhões de pessoas sofrem com depressão, e até 2030 essa será a doença mais comum no país.

A Síndrome de Burnout, ou esgotamento profissional, já é um problema reconhecido dentro das empresas, que precisam fazer alguma coisa para dar suporte a seus colaboradores. Essa questão faz parte da responsabilidade corporativa, pois cabe às organizações zelar pela saúde, segurança e qualidade de vida de suas equipes.

 

O que pode ser feito para sermos mais felizes no trabalho?

Nos últimos 2 anos, todos nós temos vivido transformações concretas numa velocidade inimaginável anteriormente. Não obstante, guardando as devidas proporções mundiais, convido vocês a trazerem para um contexto individual que ocorreu comigo lá em 2001.

Na fatídica semana em que as imagens de 11 de setembro de 2001 deixaram todos estupefatos e amedrontados, recebemos, simultaneamente, minha esposa e eu, a notícia de que sairíamos das empresas globais onde éramos executivos. Recordo claramente que o contexto era tão incompreensível, frágil e sem justificativas claras olhem o contexto BANI de que tanto se fala hoje! –, que decidimos brindar juntos, pois tínhamos confiança em nosso propósito de vida e carreira.

Decidi, imediatamente, aproveitar este momento para refletir e aprofundar meu autoconhecimento e me transformar individualmente para esse propósito. Na época, escolhi um método bastante disruptivo, chamado Processo Hoffmann de Quadrinidade, que busca alinhar todas as dimensões “CORPO-AFETO-INTELECTO-ESPÍRITO”, no sentido de ampliar a consciência e o domínio de cada indivíduo sobre o equilíbrio destas dimensões para atingir o seu propósito de vida.

Imaginem que, há 20 anos, esta reinvenção me permitiu realinhar mais do que a minha carreira e meus objetivos profissionais, impulsionando todo um projeto de vida com felicidade. Também acho importante ressaltar que o processo Hoffmann até hoje faz parte de programas de mestrado e doutorado em Harvard, contribuindo para que cada um possa ser o melhor de si na jornada do autoconhecimento.

 

A Ciência do Bem-Estar

Outra experiência interessante sobre como a felicidade é algo que pode ser ensinado, é o curso “A Ciência do Bem-Estar”, da Universidade de Yale, criado e ministrado pela professora Laurie Santos, formada em Harvard em psicologia e biologia e com doutorado pela mesma instituição. O curso, que é gratuito e online, propõe dez sessões, que podem ser acompanhadas por semana, em que as palestras de Laurie se intercalam com entrevistas com outros pesquisadores do tema, textos, teses e tarefas a serem feitas pelos alunos.

A pesquisadora diz que resolveu criar um curso sobre felicidade por causa dos casos de depressão, ansiedade e estresse que notava entre os estudantes de Yale, uma das mais prestigiadas universidades americanas. O alto nível de exigência em relação aos alunos era o principal gatilho para os casos. O seu objetivo é ensinar como a ciência e a psicologia podem oferecer lições valiosas sobre como fazer escolhas mais sábias e mudar padrões de pensamento limitantes para ter uma vida mais feliz.

A principal lição do curso está em entender e aceitar que ter o conhecimento de qualquer “verdade” não é o suficiente para que isso mude o comportamento. Para aumentar a felicidade ou bem-estar, é necessário disposição para mudar, sair da rotina, combater a inércia e até mesmo repensar os objetivos de vida e os valores pessoais.

Entre os maiores aprendizados relatados pelos alunos, está a mudança de ponto de vista sobre a relação entre dinheiro e felicidade. Ter mais dinheiro não significa necessariamente mais felicidade, mesmo em países ricos. É muito melhor gastar dinheiro com experiências do que com coisas, especialmente quando conseguimos compartilhar essa vivência com outra pessoa. Outra sugestão de Laurie é desfrutar e valorizar os bons momentos, ao invés de se preocupar sempre com o dia de amanhã.

Em resumo, o caminho para a felicidade corporativa vai muito além de gestos de bondade e gratidão. É preciso dar espaço para que indivíduos e grupos possam ter mais conexões e contribuições genuínas. E, dessa forma, valorizem menos o consumo e sejam capazes de alinhar propósitos de vida pessoal com objetivos corporativos orientados a uma sociedade mais equilibrada, justa, diversa, inclusiva - E FELIZ!!

 

Por Reynaldo Naves, sócio OLIVIA Brasil

 

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